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Fiat Pick-up City, modelo que redefiniu o espaço de conforto e praticidade nos veículos de carga

A Fiat foi pioneira na categoria de pick-ups derivadas de automóveis no Brasil, com a versão City, a marca quis explorar um nicho de clientes mais jovens

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Por Anderson Nunes


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A Pick-up Fiat City chegou com a proposta de ser um utilitário mais jovial, plataforma longa da Panorama serviu à criação da nova picape

Pioneirismo sempre foi a palavra-chave para a atuação da Fiat Automóveis aqui no Brasil. Ao aportar em solo brasileiro a fabricante de Turim agitou o mercado, ao instalar-se fora do estado de São Paulo, principal parque automobilístico do país já na época. Sua fábrica foi erguida no município de Betim, região metropolitana de Belo Horizonte, em Minas Gerais.

E o caráter inovador também ficaria evidente na linha de veículos que a Fiat passaria a disponibilizar aqui no Brasil, sendo que o chamariz seria de carros compactos dotados de um amplo espaço interno. Assim em outubro de 1976, no Salão do Automóvel, era apresentado ao público o Fiat 147, modelo derivado do similar italiano 127, lançado em 1971.

Já em terras brasileiras o Fiat 147 gerou um misto de surpresa e ao mesmo tempo espanto, já que não havia nada parecido por aqui. Com 3,63 metros de comprimento e peso de 800 kg, era menor que o Fusca em quase 40 cm. Sua distância entre-eixos também ficava bem aquém daquela do VW, 2,22 ante 2,40 m. Nas propagandas a Fiat exaltava o aproveitamento de espaço interno ao dizer: enfim, um carrão pequeno. E não era para menos, já que cerca de 80% do habitáculo era destinado aos passageiros e bagagem.

Se o pequeno tamanho do Fiat 147 chamava a atenção a sua concepção mecânica não deixava por menos. O motor de quatro cilindros de apenas 1.048,8 cm³ de cilindrada vinha em posição transversal, pela primeira vez em um carro nacional, e fornecia potência de 55 cv a 5.800 rpm e torque máximo de 7,8 m.kgf a 3.800. O comando era alojado no cabeçote (de alumínio) e recebia movimento do virabrequim por meio de uma correia dentada.

Mesmo custando mais caro que o Volkswagen Fusca, seu principal oponente, o Fiat aos poucos foi conquistando sua parcela de participação no mercado. Em 1977 surge a primeira variação de carroceria na linha 147. Nesse ano foi apresentado o modelo Furgoneta, próprio para o transporte de cargas, que abdicava do banco traseiro, janelas laterais e a vigia traseira. O Furgoneta foi muito utilizado pela própria Fiat no serviço de assistência técnica do 147, especialmente em cidades do interior, que ainda não contavam com um representante local da marca. O Touring Club do Brasil também incorporou a sua frota dezoito unidades do Furgoneta para serem utilizados como carros de pronto-socorro aos seus associados.

A Pick-up Fiat City chegou com a proposta de ser um utilitário mais jovial, plataforma longa da Panorama serviu à criação da nova picape

CRIANDO UM SEGMENTO

No Salão do Automóvel de 1978, chegava oficialmente a Pick-up Fiat 147, a primeira caminhonete nacional derivada de um veículo de passeio. Com este veículo, a Fiat inaugurava no país um novo segmento, que unia a possibilidade de transporte de carga, atividades comerciais sem deixar de lado o prazer de dirigir um modelo com características similares aos de veículos de passeio. A Fiat mirou a princípio os profissionais liberais, mas acabou por conquistar os jovens que passaram a utilizar o veículo em seu momento de lazer.

Idêntica ao Fiat 147 na parte dianteira, o modelo começava a diferenciar-se a partir da coluna central, com o corte reto da capota, além do rearranjo das colunas centrais, mais largas, que visava o reforço estrutural da carroceria. Houve também a introdução de uma parede metálica e uma nova vigia de vidro traseiro, que separava a cabine da pequena caçamba, dimensionada para transportar 380 kg de carga ou 650 litros em volume, capacidade esta que podia ser ampliada para 1.560 litros com a inclusão de uma capota de lona.

Os painéis de chapa da traseira, acima das lanternas, ganhavam formato mais verticalizado, alinhando-se ao desenho das laterais em torno da caçamba. Outro detalhe que chamava a atenção era a curiosa tampa de acesso à caçamba, com abertura lateral, que tinha no para-choque do lado esquerdo uma proteção em borracha para apoiar a tampa quando aberta. Somava-se a isso as inconfundíveis lanternas traseiras caneladas quadradas, as mesmas empregadas no modelo 147, com quatro módulos, sendo três em vermelho e um na cor branca, para as luzes de marcha à ré.

Já a parte mecânica era toda compartilhada com a versão hatch, havendo a possibilidade de dois tipos de motores: quatro cilindros em linha, de 1,05 litro com potência de 57 cv a 5.800 rpm e torque de 7,8 m.kgf a 3.800 rpm. Uma outra opção para quem quisesse mais desenvoltura era o motor de 1,3 litro, com potência de 61 cv a 5.800 rpm, ou a álcool (62 cv a 5.200 rpm), com torque máximo de 9,9 m.kgf ou 11,5 m.kgf respectivamente. Em ambos os casos a transmissão era manual de quatro marchas.

A Pick-up 147 seguia o mesmo esquema de suspensão do modelo hatch, ou seja, suspensão independente McPherson nas quatro rodas, a dianteira com molas helicoidais e a traseira com feixe transversal de molas semielípticas. Os freios eram a disco na dianteira e a tambor na traseira, servo-freio era oferecido como opcional. Rodas de aço aro 13 polegadas eram calçadas com pneus radiais 145/13.

Internamente o utilitário trazia acabamento simples, bem condizente com a proposta de ser um veículo de trabalho. Os bancos individuais de encosto baixo e laterais das portas eram revestidos em courvin. O painel continha somente o velocímetro com escala até 160 km/h e marcadores de nível de combustível e temperatura da água. Uma das peculiaridades do modelo era o volante de direção mais para a horizontal. O cinto de segurança de três pontos era item opcional.

A Pick-up Fiat City chegou com a proposta de ser um utilitário mais jovial, plataforma longa da Panorama serviu à criação da nova picape

CARGA AMPLIADA

Em 25 de março de 1981, a Fiat lançou, em Bragança Paulista, a sua nova picape batizada tão somente de Pick-up Fiat, que tinha como característica principal o aumento na capacidade de carga. Mantendo a frente antiga (dos primeiros Fiat 147), o novo utilitário era ofertado somente com o motor de 1,3 litro, chegava com a missão de substituir a Pick-up Fiat 147 (caçamba curta). A caçamba mais longa fazia a picape atingir os 3,87 metros de comprimento, mas mantinha o entre-eixos de apenas 2,22 m. Para criar tal modelo, a Fiat utilizou partes da estamparia da perua Panorama. Reforços na suspensão traseira possibilitaram o aumento na capacidade de carga para quinhentos quilos - o que era identificado pela inscrição “½ ton” junto à borracha lateral da porta. Outra característica era o diâmetro de giro de apenas 9,6 metros, o que facilitava estacioná-la em lugares de pouco espaço.

Da perua Panorama também vieram as lanternas traseiras verticais. Outra inovação era porta traseira basculante que permitia acomodar mais volumes, em um plano de carga mais baixo em relação ao solo, o que facilitava o embarque e desembarque de mercadorias. Já no entorno da caçamba foram adicionadas ripas de madeira, além de grade protetora para o vidro traseiro. Outro cuidado na segurança foi a inclusão de retrovisores externos maiores em ambos os lados, em formato retangular dotados de hastes alongadas. Tal recurso melhorava a visibilidade quando o veículo estivesse carregado. A Fiat também tratou de instalar um tanque de combustível de 52 litros, superior aos outros veículos da marca.

PEGADA ESPORTIVA

No Salão do Automóvel de 1981, foi apresentada a pick-up esportiva City. Essa versão contava com a frente batizada de Europa, o que deixava o modelo com um aspecto mais jovial. Visualmente destacava-se pelo capô de superfície lisa, com curvas ligeiramente pronunciadas à frente e nas laterais. Já os faróis retangulares ganhavam a companhia das lanternas sobrepostas de sinalização noturnas com lentes brancas e luzes de setas na cor âmbar. O para-choque era confeccionado em plástico, mesmo material aplicado à grade que agora continha cinco aletas.

Internamente havia bancos revestidos em tecido, com apoios de cabeça regulável em altura, cintos de segurança retráteis de três pontos e espelho retrovisor interno dia/noite. Para dar um ar mais moderno ao utilitário, a Fiat emprestou do modelo 147 Racing as rodas aro 13 polegadas, além dos retrovisores de plástico que trazia um aspecto diferenciado e mais esportivo. A paleta de cores oferecia quatro opções de tons: preto Etna e vermelho Ímola (sólidas), cinza Argento e verde Araruama (metálicas).

A linha de comerciais leves da Fiat continuava bem aceita, e o principal argumento de vendas era a sua maior economia de combustível em relação à concorrência. Uma campanha bem-humorada da Fiat, veiculada em 1983, dizia: “Compre uma Pick-up Fiat. Com a economia que ele faz, você poderá navegar de saveiro ou ir para o pampa”, numa clara alusão à picapes Saveiro, da Volkswagen, e Pampa, da Ford.

A última mudança ocorreu na linha 1985, quando a pick-up City recebeu a frente do modelo Spazio. Adotava faróis maiores, grade com desenho próximo ao que surgiria no Uno com a nova identidade de cinco barras inclinadas, mas mantinha o para-choque dianteiro estreito. Outra novidade era o sistema automático de injeção de gasolina para partida a frio.

A linha de pick-ups Fiat continuou a ser produzida até meados de 1988, quando foi substituída pelos modelos correspondentes ao da linha Uno (Fiorino Pick-up e Fiorino Furgão). Desse modo encerrou-se a história da primeira picape derivada de um automóvel a ser feito aqui no Brasil. Coube a Pick-up Fiat 147 e a City abrir caminhos para outros dois grandes sucessos da fabricante ítalo-mineiro: Strada e a Toro.

LEMBRANÇAS DA INFÂNCIA

A Pick-up Fiat City chegou com a proposta de ser um utilitário mais jovial, plataforma longa da Panorama serviu à criação da nova picape

Quem acompanha o segmento de veículos antigos, seja pela mídia, eventos, exposições, já deve ter notado que os veículos utilitários, como as picapes, têm ganhado cada vez mais adeptos e interesses por parte dos colecionadores. Como foram criados para o trabalho, muitos desses modelos foram utilizados até o seu término. Felizmente muitos colecionadores conseguem ver potencial nesse tipo de veículo e investem muita dedicação e dinheiro para resgatar uma picape que até pouco tempo estava na labuta.

Esse é o caso do empresário Átila Marquesin, 28 anos, da cidade de Vinhedo (SP). Desde criança teve interesse pelos os veículos antigos. A picape Fiat City 1985, que ilustra essa reportagem, foi a realização de sonho de infância. “Encontrei essa picape Fiat City, em Minas Gerais, ela pertencia a um posseiro que a utilizava diariamente. Meu pai foi dono de um modelo igual que sempre me trouxe boas recordações”, diz Marquesin.

O empresário explica que assim que o carro chegou em suas mãos, tratou de desmontá-la e restaurar no mínimos detalhes. Entretanto, ele explica que a tarefa não foi tão fácil assim devido à dificuldade de encontrar as peças para esse modelo. “O veículo foi restaurado por completo. Infelizmente restauração de veículos nacionais não é tão simples assim. Não encontramos com facilidade peças originais, e a que existem muitas vezes não são de boa qualidade. Tem que procurar muito, e pagar caro!”, explicou.

Hoje a Pick-up City traz muito orgulho ao empresário, inclusive o indagam se é de brinquedo devido ao diminuto tamanho. O veículo possui placa preta, com o certificado de originalidade. No total foram 98 pontos, os dois pontos perdidos foram por conta da pintura que não era de fábrica. Teve muita pesquisa na restauração dela, consulta em propagandas de época inclusive.

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