Para esta edição, Analisamos um modelo 2014 do Linea, com motor 1.8, 16V, E-Torq Flex, apresentado pela montadora como uma evolução do modelo anterior.
Na avaliação deste mês contamos com a colaboração do reparador Washington Luís Inocente (proprietário da Oficina TruxtiCar localizada na cidade de São Paulo) , que iniciou na área consertando veículos que comprava, pois não tinha recursos suficientes para adquirir um modelo mais novo e arcar com o custeio de sua manutenção.
Os consertos o estimulavam, mas, ao mesmo tempo, ele percebia que não conhecia nada do segmento. Comprou, então, um livro de mecânica básica da linha automotiva e começou a entender o que era ciclo Otto, sistema de ignição e sistema de alimentação, entre outros itens, para começar a consertar carros mais antigos. Mais tarde, entrou como mecânico em uma concessionária Fiat, denominada Firenze, onde trabalhou e fez vários treinamentos por muitos anos até montar o seu próprio negócio, a TruxtiCar Mecânica, na Vila Mariana, bairro da capital paulista.
“Hoje, a maioria dos reparadores não sabe o que é metrologia, instrumentos como paquímetro, micrômetros, relógios comparadores, folgas centesimais, milesimais – palavras como estas são totalmente desconhecidas do reparador atual de veículos. Apesar de haver mais escolas especializadas em ensinar mecânica, percebo que a reparação automotiva está ficando sem profissionais com paixão; a juventude só pensa em dinheiro, o que é uma pena”, relata Washington.
Na TruxtiCar, são atendidos cerca de 60 veículos por mês, muitos da Fiat. O Linea representa 5% dessa demanda e, apesar de ser um veículo que o reparador diz apreciar, ele não gosta de sua motorização.
MOTOR
Washington explica que de maneira geral aprecia a linha Fiat: “Sou do tempo em que motores eram ajustados de forma bem diferente dos dias atuais; nós, mecânicos, montávamos e conferíamos as folgas do motor e, depois de montados, tinham que ser amaciados”. Hoje, o carro já pode sair acelerado, e o profissional se diz chateado ao constatar reparos incorretos; para ele, a reparabilidade deste modelo, apesar de trabalhosa, é gratificante e ele não vê dificuldade nenhuma. Do alto de sua experiência dá sua opiniãodo propulsor avaliado:
“Este motor não me agrada: o torque é ineficiente nas situações de baixa rotação, e falo inclusive como usuário. Isso é confirmado pelas reclamações dos proprietários, que reclamam achando que é um defeito,infelizmente, temos confirmado que se trata de uma característica deste motor”, afirma.Segundo o reparador, mesmo os proprietários do Bravo que possui a mesma motorização reclamam desta característica: “Tenho um cliente e que teve seu Linea roubado e decidiu vender o veículo e comprar um de outra marca com uma motorização 1.8...porém ele observou um desempenho muito melhor, ai tive a chance de explicar o efeito da curva de troque na dirigibilidade...”.
Ele cita, também, como outro defeito que persegue este motor E-Torq, este ainda mais grave e que envolvea quebra dos pistões. “Já peguei um três casos destes e um dos sinais é um barulho forte dentro do motor”, Explica Washington.
“Vejo que este problema se refere à fadiga de material na região dos pistões, mas a Fiat nega esta condição, atribuindo o fato de o defeito ser causado por combustível de má qualidade. Alguns colegas afirmam que o defeito é causado por erro no software da ECU com relação ao ponto de ignição, fazendo com que o motor trabalhe com uma pequena detonação, imperceptível ao condutor, e que provoca a ruptura do pistão. Quando efetuada a intervenção em garantia, se corrige o problema reprogramando a ECU. Mas discordo: trabalhei com veículos nos quais a motorização tinham taxas muito maiores, pressão de compressão elevadíssima e pontos de ignição altos, e o pistão durava 150 mil km, isso na própria Fiat, então vamos observar este modelo para ver se não ocorrerá novamente”, informar Washington.
Os coxins do motor também se parecem com o do modelo anterior e, provavelmente, trarão os mesmos defeitos – sobretudo, barulhos, principalmente quando o veículo trafega em pistas irregulares em uma determinada frequência. Esse ruído se assemelha ao de um amortecedor defeituoso, e pode acontecer, segundo Washington, de o reparador trocar a peça errada. Neste modelo, o motor não possui correia dentada, e sim corrente de distribuição. Para o reparador, é melhor para o proprietário, que não precisa se preocupar com a troca da correia de distribuição, e pior para o profissional, pois o veículo vai menos para a oficina, apesar de o motor transmitir mais vibrações e ser mais ruidoso.
Percebemos, neste modelo, um 5º injetor no sistema de partida a frio, e Washington nos explica como funciona sua estratégia.
Ele afirma que duas condições deverão ser satisfeitas no momento da partida para acionamento do sistema de partida a frio:
• Temperatura do líquido do sistema de arrefecimento <17ºC;
• A/F compreendido entre 9 e 10.
A injeção de gasolina em aceleração é permitida apenas se a partida do motor acontecer abaixo de 17º C e finaliza aproximadamente a 35º C de temperatura de água do motor.
A bomba do reservatório de gasolina do 5º injetor funciona enquanto forem permitidas injetadas de gasolina para acelerações, agilizando, assim, a resposta do sistema às necessidades do motor.
É aplicado um tempo de injeção calibrável em função da temperatura de água e A/F. Esta estratégia é aplicada apenas em acelerações que ultrapassam 8% de pedal.
Caso ocorra uma nova aceleração em cinco segundos, o valor do tempo de injeção decresce na razão de um valor calibrável para não ocorrer o “afogamento” do motor. A cada cinco partidas, acima de 30°C de temperatura de água, o 5º injetor realiza três injetadas com um tempo de injeção de 10 ms e uma pausa entre elas de 100 ms, durante a partida.
Este procedimento é necessário para manter o bico sempre lubrificado e limpo no caso em que o usuário não realizar partidas com álcool abaixo de 17ºC de temperatura de água, ou utilizar somente gasolina.
Para compensar esta injeção extra de combustível, é aplicada uma redução do tempo de injeção dos injetores principais.
Esta é uma queixa deste reparador, que relata: principalmente após 40 mil km rodados, todas as vezes que efetua um reparo, há a necessidade de remover o filtro de ar – a cada dez veículos, dez estão quebrados.
Alguns reparadores, com receio de avisar o cliente, apesar de ter grandes chances de ter sido o próprio quem quebrou a peça, recolocam o filtro com o suporte quebrado ou mal colado ou, na maioria das vezes, nem o colocam mais.“A Fiat dimensionou mal esta peça de fixação do filtro de ar; as guarnições, onde os pinos são fixados, deveriam ter menos interferência, pois, com a ação do tempo e trocas constantes de calor e umidade, deixam a interferência maior. No momento em que vamos retirar o filtro de ar para manutenção, fatalmente quem é inexperiente vai quebrá-lo, e até para os mais experientes há risco”, afirma Washington.
TRANSMISSÃO
“Desde que conheço o Linea, defino esta evolução da seguinte forma: a Fiat manteve as características desde o seu lançamento; somente a transmissão passou de totalmente mecânica para uma com sistema automatizado freechoice”, explica o reparador.
Porém, além do sistema freechoice, ele observa que não houve modificações: a transmissão é a mesma e ele acredita ter os mesmos defeitos. O mais frequente é arranhar as marchas, pois os anéis sincronizados perdem a capacidade de frenagem das engrenagens. Antes, isso era muito frequente, mas, segundo ele explica, vem melhorando com o passar dos anos – desde os 147, a Fiat carrega esta questão em relação à transmissão, mas evoluiu bastante.
FREIOS
Washington verificou que o sistema de freio está equipado com ABS e, por isso, o dianteiro está composto de um disco ventilado e um jogo de pastilhas maior, o que ele considera bom. Os veículos sedans são mais pesados e, por isso, gastam muito o freio dianteiro, pois a carga de frenagem é concentrada na parte da frente do carro. Outro ponto positivo no freio é com relação ao sistema EBD (Electronic Break Distribution, que em português é Distribuição Eletrônica de Frenagem), que efetua um controle eletrônico muito mais eficiente, sem o desconforto dos ruídos provocados pelo sistema mecânico de corretor de frenagem.
SUSPENSÃO
O reparador ressalta que este modelo do Linea está equipado com rodas aro 16”, com pneus 205x55x16, 91V, o que deixa o sistema de suspensão bem macio.
“No momento da troca do amortecedor dianteiro, verifico a necessidade de remover parte da churrasqueira para ter acesso aos parafusos de fixação da parte superior dos amortecedores dianteiros. Com o tempo, estas guarnições, pinos e tampas ressecam e, uma vez tiradas, nunca serão as mesmas, principalmente quando estiverem fatigadas pela ação do tempo. Temos que ter muito cuidado para não danificá-las, mas há momentos em que isso é inevitável”, explica Washington. Ao longo dos anos, principalmente o sistema de suspensão traseiro da linha Fiat evoluiu muito em reparabilidade. “Antes, tínhamos que desguarnecer toda a tapeçaria traseira para termos acesso aos parafusos de fixação dos amortecedores; nos modelos mais novos, o acesso ficou muito melhor”, relata Washington.
Este modelo não segue uma característica da Fiat (147, Picapes e comercias leves), que é o de adotar o sistema de suspensão traseira equipado com feixes de mola. “Neste modelo, acredito por ser sedã, com proposta de ser confortável, a suspensão traseira é constituída de molas helicoidais, diferente de feixe de molas, que deixam a suspensão mais resistente e que suporta mais peso. O veículo, porém, fica mais ‘cabritinho’, o que, com certeza, iria incomodar muito os clientes que optam por este modelo”, completa o reparador.
PAINEL DE INSTRUMENTOS
O sistema de iluminação interna é considerado melhor do que o anterior. “Necessitávamos desmontar constantemente o painel como um todo para trocar as lâmpadas, que eram incandescentes. Hoje a Fiat utiliza lâmpadas em LED e espero que neste modelo a montadora as mantenha, pois trocar essas lâmpadas sempre causa estresse, principalmente para nós, reparadores”, se queixa Washington.
ABERTURA DA PORTINHOLA
Algo que parece um detalhe chama a atenção de Washington neste modelo e diz respeito a “portinhola” de abastecimento.
O reparadoralerta que o sistema de trinco elétrico que abre a portinhola da tampa de abastecimento: deveria ter um acesso melhor – não mais fácil, mas aprimorado. Ele verificou que o sistema é o mesmo utilizado no GranSiena, e em uma ocasião no momento de uma pane elétrica, teve que remover os parafusos de fixação desta portinhola para que o proprietário pudesse abastecer o veículo enquanto reparava.INFORMAÇÃO TÉCNICA
“Como trabalhei muitos anos em concessionária Fiat e hoje minha especialização é trabalhar com a marca, consigo informações da própria fonte. Porém para aqueles que não tem a mesma facilidade que eu, sei do site da Fiat que tem este propósito, porém a empresa parece mais distante do reparador”, explica.
Para Washington, fica evidente a importância das montadoras se relacionarem com os independentes, pois de fato quem mantém a maior parcela da frota das montadoras circulando são o reparadores com ele. “Treinar,estimular, dividir informação, enfim relacionar-se com o reparador independente é garantia de sucesso para qualquer montadora, afinal nós é que na prática fazemos o pós-vendas dos fabricantes” conclui Washington.
PEÇAS DE REPOSIÇÃO
Há alguns anos, peças genuínas eram muito caras e com pouca disponibilidade, sem falar no interesse mínimo das concessionárias em vender para as oficinas, o que praticamente inviabilizava sua aplicação. Diante desta realidade os reparadores não tinha opção e focavam 100% de suas comprasnas marcas e nos fornecedores do mercado paralelo.
“Hoje, devido à concorrência e com a vinda de mais montadoras, elas perceberam um mercado que não exploravam. Com uma revolução em sua logística, a Fiat e suas concessionárias começaram a investir na venda de peças de reposição para oficinas com preços competitivos, disponibilidade e atendimento diferenciado para nós” esclarece Washington
Ele afirma que as peças mais comuns, como filtros, sistema de freios e lubrificantes, ainda são adquiridas no mercado independente, dividindo a compra entre a loja de autopeças e diretamente no distribuidor.
“A qualidade da peça, principalmente nos itens de maior responsabilidade é algo que o reparador não pode abrir mão e ai a genuína da montadora é indiscutível, porém só isso não nos ajuda o que faz a diferença é a aproximação do fabricante do veículo com a oficina independente”, conclui Washington.
Quanto ao seu papel de formador de opinião Washingo esclarece que, pelas características técnicas deste modelo, costuma não recomendá-lo aos seus clientes.